Herpes labial

Em pacientes saudáveis, a infecção por herpes simplex é normalmente uma lesão de menor importância. No entanto, há situações em que o herpes inspira cuidados acrescidos, nomeadamente:

  • Nos pacientes imuno-deprimidos (seja por doença seja por medicamentos), as lesões podem ser mais graves e, a par das lesões características do herpes labial, os pacientes podem desenvolver “estomatite herpética”, ou seja, uma infecção herpética dos tecidos intraorais ou mesmo da orofaringe;
  • Nas infecções oculares por herpes simplex;
  • Nos casos de encefalite herpética por difusão e multiplicação do vírus no cérebro;
  • Quando as crises ocorrem com uma frequência superior a 6x/ano.

Nestes casos deve-se ponderar fazer uma terapêutica continuada com anti-viarais com o objectivo de inibir o vírus. O herpes labial aparece sobretudo a nível do “vermelho do lábio”, local de menor resistência, e é muito contagioso, transmitindo-se tanto por contacto direto como por gotículas de saliva. Depois de contaminar um indivíduo (primo-infecção), o vírus atravessa a pele e, através das fibras nervosas, instala-se num ponto inacessível ao sistema imunitário. Permance “entrincheirado“ para sempre a nível de alguns nervos sensoriais da cabeça, num estado como que “adormecido e invulnerável”, podendo permanecer nesse estado sem nunca se manifestar. No entanto, em 20 a 30% dos casos o vírus reativa-se, multiplica-se e origina a chamada infecção recorrente (normalmente 1 a 2 surtos por ano). Aparecem as lesões labiais características que evoluem mais ou menos segundo um padrão, com pequenas variações de indivíduo para indivíduo em intensidade, dor e duração:

  • 1º ao 3º dia: aparecimento de zona avermelhada com ligeiro inchaço, ao que se segue o aparecimento de pequenas vesículas ou bolhas com cerca de 1 mm de diâmetro que tendem a confluir;
  • 4º dia: rompimento das vesículas provocando uma ulceração avermelhada. É a fase mais dolorosa e também a mais contagiosa, na medida que as vesículas estão repletas de um liquido que contém milhões de vírus;
  • 5º ao 8º dia: formação de crosta acastanhada que, no caso de fissurar, sangra;
  • 9º ao 14ª dia: a crosta seca e tudo cicatriza sem deixar marcas.

As lesões recorrentes do lábio aparecem normalmente no local onde se deu anteriormente o contágio ou numa zona próxima. As lesões tendem a cicatrizar em 7 a 10 dias podendo, em alguns casos, estender-se a 2 semanas (tudo depende do estado do indivíduo, do tratamento instituído e do momento do início do tratamento). Já nas primo-infecções, as lesões labiais, quando se manifestam, podem persistir até 3 semanas. Mas atenção, algumas pessoas não chegam a formar vesículas, apenas lhes aparece zona avermelhada no lábio.

Além disso a maioria das primo-infecções ocorre sem qualquer sintomatologia (infecções sub-clínicas), ou seja, as pessoas são contaminadas mas não se apercebem disso. Sendo assim, muitas são as pessoas que nunca chegam a saber que estão infectadas pelo vírus Herpes Simplex. Tal facto é importante sobretudo se pensarmos que são pessoas que não procuram ajuda e que não se tratam nem tomam as devidas medidas de precaução que impeçam a transmissão do vírus, seja a outras partes do corpo (ex: olhos) seja a terceiros.

Apenas alguns casos desenvolvem as referidas lesões labiais características e muito raramente ocorrem sintomas sistémicos que podem preceder o aparecimento das lesões labiais e durar até 5 dias (ex: febre, cansaço, dores musculares, dor de garganta ou aumento dos gânglios do pescoço). Nos surtos de infecções recorrentes, dada a imunidade adquirida após a primo-infecção, não se verifica normalmente a presença dos sintomas sistémicos atrás referidos.

Alguns factores, que variam de pessoa para pessoa, podem desencadear o aparecimento de surtos ou infecções recorrentes. São eles: sistema imunitário enfraquecido, constipação, gripe, fadiga, tempo frio, exposição solar, menstruação, alterações hormonais, febre, stress, distúrbios gastro-intestinais ou simples irritação local inclusive a decorrente de tratamentos dentários (por vezes só a preensão do lábio durante uma consulta pode despoletar uma crise…).

Não há tratamento definitivo. No entanto, já estão disponíveis vários fármacos anti-virais (aciclovir e derivados, sulfato de zinco, sulfadiazina de prata) em diferentes apresentações que podem ser selecionados pelo médico de acordo com o tipo e localização de infecção herpética, mas também de acordo com o estado do paciente. Exemplo: em pacientes imunodeprimidos é aconselhado, a par do tratamento tópico com cremes, fazer o tratamento sistémico com comprimidos.

Terapêutica/Posologia

  • O aciclovir apresenta-se em comprimidos de 200 mg e 800 mg. No tratamento de infecções por Herpes simplex no adulto recomenda-se 200 mg, cinco vezes por dia, em intervalos de aproximadamente 4 horas, omitindo a dose da noite. A duração do tratamento deve ser de 5 dias, no entanto, em infecções iniciais graves poderá ser necessário o seu prolongamento. Em doentes gravemente imunocomprometidos (p.ex. após transplante de medula óssea) ou com absorção intestinal deficiente, a dose pode ser duplicada para 400 mg, ou em alternativa, poderá considerar-se a administração intravenosa. Atenção aos pacientes com insuficiência renal ou hepática (dialogar com médico assistente);
  • O aciclovir 80 mg suspensão oral é indicado para tratamento e profilaxia de infecões por Herpes simplex em crianças:
    • crianças com mais de dois anos de idade: 40 a 80 mg/kg/dia, divididos em 3 a 4 doses (máximo 1000 mg/dia).
    • crianças com menos de dois anos de idade deve ser administrada metade da dose: 20 a 40mg/kg/dia divididos em 3 a 4 doses (máximo 500mg/dia).
  • O Valaciclovir, quando absorvido, é rapidamente e quase completamente convertido em aciclovir. A sua apresentação é de comprimidos de 1000 mg,500 mg e 250 mg, não possuindo forma tópica. Em episódios de recorrência o seu uso seria de 1 comprimido 500mg 1x ao dia (com as refeições) durante 5 a 7 dias dias, podendo estender-se por 10 dias em casos mais severos. Em doentes com recorrências muito frequentes, poderá obter-se benefício adicional ao administrar a dose diária de 500 em doses divididas ( 250 mg duas vezes por dia). Em doentes imunocomprometidos, a dose recomendada é de 500 mg duas vezes por dia. Não administrar a crianças e tomar as devidas precauções em pacientes com insufeciência renal ou hepática (dialogar com médico assistente);
  • O Famciclovir apresenta-se em comprimidos de 125 mg e 250 mg. A dosagem nos casos de herpes simples seria de 125mg, duas vezes ao dia, durante 5 dias, deixando os de 250mg para os casos mais graves. Em doentes imunocomprometidos com infecção recorrente a herpes simplex a dose recomendada é de 250 mg, duas vezes ao dia. Nestes casos a duração do tratamento depende da gravidade da doença e é estipulada pelo médico.
  • Ganciclovir só existe na forma injetável ficando o seu uso para os casos mais graves.

Para o banal herpes labial, o Aciclovir-creme é vendido sem receita médica, sendo efetivo sobretudo se aplicado após o aparecimento dos primeiros sintomas no entanto há quem preconize que localmente só devem ser aplicados solutos inertes, para evitar qualquer tipo de sensibilização, do tipo do éter ou sulfato de zinco a 2% acompanhado de medicação per os (aciclovir, valaciclovir) desde uma fase tão precoce quanto possível para “abortar” os surtos e resolver as lesões de uma forma mais rápida.

A secura labial e a descamação são efeitos pós-infecção que podem ser compensados com bons cremes hidratantes nomeadamente, sugestão minha, com creme à base de triéster do glicerol oxigenado. A aplicação dos cremes ou solutos deve ser feita com aplicadores específicos, um simples cotonete ou com uma luva e nunca com os dedos desprotegidos, pois há casos descritos de contração de lesões herpéticas nos dedos (panarício herpético). Atenção às mães que aplicam o creme nas lesões de herpes dos filhos…

O tratamento precoce dos episódios recorrentes permite reduzir substancialmente o tempo de cicatrização, reduzindo o constrangimento social associado a este tipo de lesão. O tratamento deve começar assim que aparecerem os primeiros sinais de atividade viral. Algumas pessoas referem sintomas específicos (sintomas prodrómicos), mesmo antes de aparecerem as lesões labiais características, nomeadamente formigueiro, comichão, ardor, latejamento, tensão ou picadas. No entanto, a grande maioria não passa pelos sintomas prodrómicos, passando diretamente para o surgimento duma zona avermelhada no lábio. Os pensos específicos de hidrocoloides também são uma alternativa interessante:

  • o penso torna a lesão do herpes labial menos visível (inclusive sobre o penso pode ser aplicada maquilhagem);
  • alivia a dor dado que protege as terminações nervosas expostas pela ferida;
  • promove a hidratação da pele reduzindo a sensação de formigueiro, prurido e ardor.

A sua aplicação antes de dormir pode trazer vantagens acrescidas, na medida que reduz o risco de contágio através da ferida durante o sono sobretudo por contacto involuntário dos dedos com a ferida herpética e olhos. Tendo em conta que o herpes ocular é uma da principais causas de cegueira nos EUA, pode-se justificar mesmo o uso de máscara ocular durante a noite enquanto durar uma crise. A par destas medidas, outras se devem tomar durante as crises de herpes labial:

  • lavar as mãos com regularidade e, se possível, com um sabonete antisséptico, sobretudo se tem o mau hábito de aplicar o creme anti-viral com os dedos desprotegidos;
  • descansar e alimentar-se convenientemente;
  • evitar a propagação a terceiros, evitando beijar outra pessoa e não partilhar copos, garrafas, talheres, toalhas, guardanapos, lâminas de barbear ou instrumentos de sopro.

Fora das crises, é importante reduzir o impacto de factores que saibamos serem desencadeadores. Exemplo:

  • tomar precauções contra o vento, frio e sol;
  • consoante a situação, aplicar filtro solar ou protetor labial à base de óxido de zinco ou mesmo um simples hidratante para evitar que os lábios fiquem muito secos.

Existem grupos de trabalho a tentar desenvolver uma vacina tal é o impacto desta doença e tem-se utilizado também com alguns resultados o laser de baixa intensidade. Importante: em caso de dúvida informe-se com o seu médico-assistente, dermatologista ou médico-dentista/estomatologista acerca desta infecção viral.

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